Os desafios educacionais diante da digitalização, da inteligência artificial e da educação a distância foi tema de uma concorrida mesa na tarde de ontem, 12/11, na Capela Ecumênica, no segundo dia do III Congresso Mundial Contra o Neoliberalismo na Educação.
Marco de uma nova fase do capitalismo, as novas tecnologias digitas produzem impactos na formação das novas subjetividades, com implicações que levam à diminuição da sociabilidade, reforço do individualismo e do empreendedorismo no espaço escolar. Estas foram algumas questões levantas pelos debatedores, segundo o relator da mesa, professor Pablo Bielschowsky, 2º secretário da Regional Rio do Andes-SN.
Os debatedores apresentaram um preocupante cenário decorrente do modelo pelo qual as novas tecnologias estão sendo implementadas na Educação, em especial na América Latina. A redução dos cursos de humanidades com o privilégio ao ensino técnico, o aprofundamento da precarização do trabalho de educadores, tratados como meros operadores tecnológicos, além das dificuldades de acesso às novas tecnologias, o que aumenta a disparidade entre as regiões centrais e periféricas, foram alguns dos problemas apresentados pelos palestrantes.

Segundo o professor Hernán Rubio Vivas da Asddetol (Associacion Sindical de Directivos Docentes del Tolima), a maioria dos docentes da Colômbia está acima dos 50 anos e tem grande dificuldade no manejo das novas tecnologias. “Parte destes docentes optou por se retirar da carreira, outra tentou se adaptar. É óbvio que este processo intervém na saúde em muitos aspectos. As instituições educativas impõem dezenas de plataformas para desenvolver seus projetos pedagógicos. O docente deixou de ser pedagogo para se tecnógrafo”, aponta.
Para o professor Lev Velásquez, da CNTE – México (Coordinadora Nacional de Trabajadores de la Educación), o uso acrítico das tecnologias não só tem precarizado o trabalho docente mas a própria educação. “Por muitos anos, foi vendida a ideia de que usar a tecnologia melhoraria os processos de ensino e aprendizagem. A prática nos mostrou que não é assim”.
O docente lembrou ainda de aspectos políticos e econômicos implicados neste processo. “Não compartilho totalmente da ideia de que se faça uma distribuição massiva de ferramentas tecnológicas. É o que quer o neoliberalismo educativo: transferir parte fundamental do financiamento da educação, que deveria ir para melhorar salários e a infraestrutura educativa, para as big techs (grandes empresas de tecnologia). Seria fundamental que nossos países fossem autônomos e soberanos na produção de uma tecnologia pública, de uso público. Com certeza, somos capazes disto. Mas isso não é do interesse dessas grandes empresas”, concluiu.

A professora Kendy Chacón Viquez, da Asociación de funcionarios del TEC (Afitec), na Costa Rica, também mencionou a diferença geracional como uma dificuldade a mais no processo de implantação das novas tecnologias. “Os docentes não têm a mesma competência digital que muitos dos estudantes. É um trabalho de transição que vai continuar. E é necessário investir na capacitação destes docentes. Hoje a implementação dessas tecnologias implicam um acréscimo de demanda de trabalho para o docente”.
Processo semelhante foi destacado pela professora Luz Palomino da organização Otras Voces en Educación (OVE), da Venezuela. “Antes da pandemia, o docente da América Latina não estava preparado para utilizar as novas tecnologias. Depois da pandemia, fomos obrigados a utilizá-la, sem formação, sem nenhuma política pública educativa para este fim. Na Venezuela, ainda hoje não há esta política. Dizem para os docentes que eles têm de estar preparados, que tem de manejar as ferramentas, mas não se dá a formação para isto”, denuncia.

Representando a ANPG/Brasil (Associação Nacional de Pós-Graduandos), Jean Felipe Dourado Pirola, ressalvou as condições materiais que demandam, em alguns casos, a educação a distância, como no exemplo das estudantes mães. “Mas é necessário também transformar as condições do ensino presencial, viabilizando, neste caso, creches nas instituições de educação”.
De uma forma ou de outra, todas as questões apresentadas pela mesa passaram pela organização política de trabalhadores e estudantes, apontou a representante do Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica), Artemis Martins. “Não sou das que defendem a abolição da tecnologia no meio educacional. Ao contrário, espero que venham facilitar e garantir a qualidade de vida da classe trabalhadora. Para isto, mais do que nunca, precisamos construir, na América Latina, redes de resistência e de luta para que enfrentar todo esse processo de colonização que estamos submetidos historicamente e, agora, mais uma vez, com as novas tecnologias digitais”, enfatizou.
A luta política também foi ressaltada pela presidente da Asduerj, Amanda Moreira, que mediou o debate. Para Amanda, a mesa cumpriu o objetivo de trazer elementos da conjuntura atual da educação no mundo. “Espero que a gente possa unir forças a partir destas diversas realidades apresentadas aqui, e que podem ser traduzidas na necessidade da organização da luta de trabalhadores e estudantes”.